sábado, 13 de março de 2021

As lições do massacre de Jonestown ou: ainda vale a pena morrer por ideologias?

 




Foi em 1978. Eu era garoto e via nas revistas as fotos de centenas de cadáveres, alguns abraçados a seus entes queridos, formando uma horrível tapeçaria colorida vista de cima. Era o massacre de Jonestown, na Guiana.

Tudo começou como uma utopia. E terminou com a morte por "suicídio revolucionário" de 909 cidadãos norte americanos (304 deles menores de idade) incluindo o lider do movimento Templo do Povo, reverendo Jim Jones. O número de mortos era, até aquele momento, o maior número de vítimas fatais não naturais de cidadãos americanos em um único evento desde a Guerra da Secessão, só superado pelo 11 de Setembro. Na época nem se imaginava que os Estados Unidos teriam quatro vezes mais mortes diárias por uma doença, em uma pandemia que colocou o mundo de joelhos.

Lembro que eu passei vários dias impressionado com o fato. Não conseguia admitir que multidões fossem capazes de se deixar seduzir a ponto de marcharem para a própria morte, tomando cianeto de potássio preparado em baldes industriais.

Interessante é que a esperança socialista cristã e autosustentável do Templo do Povo poderia ter dado certo. O reverendo, que tinha tentado implantar sua seita também no Brasil, chegou a receber elogios, apoio político e muitas pessoas desesperançadas se uniram a ele para conseguir comprar um pedaço de terra em um país da América do Sul e erguer, no meio da selva amazônica, algo que era considerado o novo paraíso.

Jim Jones recebe o Prêmio Humanitário Martin Luther King Jr. do pastor Cecil Williams, em 1977 / Crédito: Wikimedia Commons

Em algum momento, Jones começou a deixar vazar o seu lado mais sombrio. Passou a se achar a reencarnação de Jesus, Buda e Lenin, ao tempo que molestava sexualmente os discípulos, proibindo a saída de dissidentes. 

Após receber a visita de fiscalização de uma comissão do congresso norte americano coordenada pelo congressista Leo Ryan, com a participação de repórteres da NBC, se sentiu acuado e conduziu todos para a morte no fatídico dia 18 de novembro, após ordenar a execução dos visitantes, quando estes se encontravam embarcando no avião de volta para casa.



Recentemente passei a relembrar esse episódio macabro da história moderna com mais interesse e renovado assombro. Especialmente questionando se ainda existem ilusões a serem vividas com a mesma intensidade. Já vimos todo tipo de atrocidade ser praticada em nome de utopias, das mais estranhas a outras até factíveis, mas que resultaram invariávelmente em arrependimentos. 

A morte do comunismo, do movimento hippie, do nazismo, da TFP, do rock´n roll, entre outras entidades em voga no século vinte, nos fazem pensar se ainda temos, em plena pandemia devastadora e falência de instituições, motivos para acreditar em utopias. Para mim soa claro e cristalino que nenhuma delas vale a perda de sequer uma vida humana.

Essas experiências fatídicas já deveriam ter conduzido a humanidade a um novo patamar de compreensão dos embates ideológicos a ponto de tornar as ideologias fora de moda, rejeitando definitivamente as tentativas de engaiolar o pensamento e buscar simplesmente o bom senso acima de tudo. 

Eu pensava que o que já foi já era.

Infelizmente vejo que não é bem assim. Afinal, se as lições da história fossem levadas a sério, após a primeira guerra mundial não teríamos tido a segunda. 

Em outras palavras, na grande escola das civilizações no universo, a humana está sempre tirando nota baixa e repetindo de ano.


Celso Rommel




Nenhum comentário:

Postar um comentário